quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Direito das obrigações

  O homem, onde esteja, se vê rodeado de situações onde lhe são impostos deveres e obrigações, alguns não atingem a órbita jurídica, permanecendo como deveres de cortesia, espirituais etc. Entretanto, alguns deveres atingem o campo do Direito, sendo protegido por ele contra seu não cumprimento. Esses deveres são chamamos de obrigações civis.
  A obrigação contém uma idéia de vínculo entre credor (sujeito ativo) e devedor (sujeito passivo), vinculo esse que não tem caráter perpetuo se desfazendo junto da obrigação quando essa se satisfaz, seja no seu adimplemento como na total impossibilidade de cumprimento.
  Para Savigny, a obrigação consiste na dominação sobre uma pessoa estranha, não sobre toda a pessoa pois que isto importaria em absorção da personalidade, mas sobre atos isolados, que seriam considerados como restrição a sua personalidade, ou sujeição à nossa vontade.
Clóvis Beviláqua a define como, a relação transitória de direito, que pode nos constranger a dar, fazer ou não fazer alguma coisa, em regra economicamente apreciável, em proveito de alguém que, por ato nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado,ou em virtude da lei, adquiriu o direito de exigir de nós esta ação ou omissão.
  Mais correto e completo parece a definição de Washington de Barros Monteiros que diz que a obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor, e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio;
 Relação de caráter transitório, pois ninguém está unido a uma relação obrigacional infinitamente, ela tem um começo e um fim. Econômica, pois deve ser suscetível de valoração pecuniária.Positiva, pois pode ser de dar ou fazer e negativa de não fazer. Essa obrigação existe entre dois sujeitos, um passivo que é o devedor e o outro ativo que é o credor, tendo este o direito de exigir que a prestação seja cumprida pelo devedor através do seu patrimônio.


 Elementos constitutivos da obrigação:

    
   1 ) Os sujeitos :  São os elementos subjetivos da obrigação, pode ser determinado no momento da     constituição da obrigação ou posteriormente por ocasião de sua execução. Perdurando a incerteza quanto ao sujeito, o individuo envolvido na relação obrigacional poderá consignar em juízo para que o magistrado decida quem o deve ser.
 Qualquer pessoa física ou jurídica de direito publico ou privado, de fins econômicos ou não, como também as sociedades de fato e irregulares, podem apresentar-se ativa ou passivamente em uma relação obrigacional.O sujeito ativo é o credor(réus credendi), tendo ele o direito de exigir sua prestação positiva ou negativa do sujeito passivo (réus debendi), com quem deve colaborar para o adimplemento da prestação. 
  Uma obrigação pode ser formado por mais de um sujeito em cada um dos pólos, ou seja pode vir acompanhada de vários sujeitos ativos e passivos quer concomitantemente quer supervenientemente. Sendo assim possível que só um credor tenha direito de exigir a obrigação de vários sujeitos passivos ou ainda que vários credores o sejam de vários devedores. A pluralidade subjetiva comporta várias hipóteses que geram outras tantas modalidades de obrigações.

2 ) O objeto :  Constitui uma prestação a ser cumprida, de dar, fazer ou não fazer. Não deve ser confundida com o objeto que é a coisa em que a obrigação recai, como um carro na obrigação de dar e um vestido na de fazer. Os objetos são respectivamente o dar e o fazer.Seguem quatro elementos essências em um objeto, são eles: Possibilidade;licitude;determinabilidade;patrimonialidade
  Um objeto antes de tudo deve ser possível, seja juridicamente ou fisicamente, o primeiro diz respeito a sua consecução na conformidade com a ordem jurídica, essa há de confundir-se com a própria licitude da obrigação. Quanto a impossibilidade física, h la atem as leis físicas, não sendo valida por exemplo a realização de uma obrigação onde uma empresa aérea se compromete a transportar um passageiro do Brasil ao Japão em 5 minutos, por falta-lhe um requisito essencial do objeto obrigacional, a possibilidade física.
 Essa impossibilidade pode se dar concomitantemente a  formação do vinculo jurídico, impedindo sua criação. Sendo esta uma obrigação nula por natureza, porém em alguns casos é permitido a uma obrigação inicialmente nula, vir a se tornar possível, se antes do advento do termo final ou do implemento de condição ao que o negocio estava subordinado ela se tornar possível.
 Poderá se dar também de forma superveniente, não embaraçando a criação da relação obrigacional, mas tornando sua realização impossível. Se for relativa, podendo a parte possível ser útil ao credor, não será inexeqüível.
 O objeto também há de ser lícito, pois uma obrigação não pode contrariar a lei, a moral e os bons costumes,  sendo nula a obrigação que estiver de desconformidade com o ordenamento jurídico.
A prestação deve ser suscetível de avaliação em dinheiro, sendo a economicidade um requisito necessário para a validade de uma prestação, mesmo quando não estiver nitidamente expresso, deve ser suscetível de valoração pecuniária, daí o seu caráter patrimonial.E por último a determinabilidade, um objeto deve ser determinado ou determinável, sendo possível a sua identificação no mínimo pela espécie e pela quantidade, como requisito de validade da obrigação.Quando esse objeto for determinável, é mister que seja feita sua individuação no momento do cumprimento da obrigação, através da concentração, ato pelo qual o devedor em regra individualiza o objeto dentro dos critérios de gênero e quantidade, se não estabelecido diferente no contrato cabe somente ao devedor a escolha não podendo ele dar coisa pior nem o credor sendo obrigado a receber o pior, resolvendo-se na escolha do meio termo.
     
3 ) O vínculo jurídico : É no vinculo iuris que reside a essência abstrata da obrigação, o poder criador de um liame por cujo desate o individuo responde outrora com sua pessoa e hoje com seu patrimônio.É ele que traduz o poder que o sujeito ativo tem de impor ao outro uma obrigação positiva ou negativa e exprime sua sujeição dentro de dois limites externos que são a seriedade da prestação e a liberdade individual.
 Na noção dualista de vínculo, existem dois elementos o débito, sendo este o dever de prestar (shuld) e a responsabilidade (halftung). O dever de prestar é próprio do sujeito passivo da relação obrigacional, é ele quem deve realizar uma certa atividade em beneficio do credor, seja ela um dare, um facere ou um non facere. Traduz o dever jurídico que impõe ao devedor um pagamento e que se extingue se esta prestação for executada espontâneamente.
  A responsabilidade se trata da garantia que o sujeito ativo tem, sua faculdade de reclamar do réus debendi a prestação daquela atividade ou do exercício do pagamento, mobilizando assim as forças cogentes do Estado, no sentido de assegurar o cumprimento da obrigação.

sábado, 11 de setembro de 2010

Princípios basilares do Direito penal.


O que é Direito Penal?


 Nenhum problema apresenta, responder essa pergunta, visto que o Direito penal pode ser definido de diversas formas diferentes e igualmente corretas.
Welzel, “É aquela parte do ordenamento jurídico que fixa as características da ação criminosa, vinculando-lhe penas ou medidas se segurança.”
Mezger, “Direito penal é o conjunto de normas jurídicas que regulam o exercício do poder punitivo do Estado, associando ao delito como pressuposto, a pena como conseqüência”.
Cuello Calón, “Direito penal e o conjunto de normas estabelecidas pelo estado que definem os delitos, as penas e as medidas de correção e de segurança com as quais são sancionados.”
 Conhecendo a definição de Direito penal, partimos para seus princípios basilares, ou seja, fundamentais, que devem estar bem fixados na memória, pois através deles seremos capazes de interpretar o caso concreto e estaremos em sintonia com a mente dos grandes juristas.

Princípio da Legalidade ou reserva Legal
Representado através da expressão latina Nullum crimen, nulla poena sine lege.
 Não se apresenta mais em nossos dias o direito de punir com poder absoluto do Estado sobre a pessoa do cidadão. O direito de punir constitui limitação jurídica ao poder punitivo do Estado, pois no Estado moderno o exercício da soberania esta subordinada ao Direito.
  Em termos bem esquemáticos, pelo principio da legalidade a criação de normas incriminadoras e função exclusiva da lei, isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada, sem que antes da ocorrência do fato exista uma lei definindo-o como crime e cominando-lhe uma sanção penal. Como disposto no art 1º do Código Penal e reforçado pela constituição de 1988, ao proteger os direitos e garantias fundamentais, em seu artigo 5º, inc. XXXIX, determina que não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

Princípio da intervenção mínima
  Assim como o principio da reserva legal, o principio da intervenção mínima  funciona como limitador do arbítrio judicial, preconizando que a criminalização de uma conduta só se legítima se constituir meio necessário para proteger determinado bem jurídico.Revelando-se suficientes outras forma de controle social para a proteção desses bens, sua criminalização não seria recomendada. Ou seja, o Direito penal deve representar a ultima ratio, deve atuar somente quando os demais ramos do Direito revelarem-se incapazes de dar tutela devida a esses bens importantes para a sociedade.
Como preconizava Maurach, “na seleção de recursos próprios do Estado, o Direito penal deve representar a ultima ratio legis, encontrar-se em ultimo lugar e entrar somente quando resulta indispensável para a manutenção da ordem juridica”.

Princípio da Fragmentariedade
 O Direito Penal seleciona quais bens jurídicos pretende proteger, e quais condutas ofensivas quer proibir. Assim sendo fragmenta-se e limita seu poder de intervenção na vida social. Afinal, nem todo bem é jurídico e nem todo bem jurídico é jurídico-penal; nem toda conduta é ofensiva e nem toda conduta ofensiva é proibida pelo Direito Penal. Como já afirmava Binding, o Direito penal não constitui um sistema exaustivo de proteção de bens jurídicos, de sorte abranger todos os bens que constituem o universo de bens jurídicos, mas representa um “sistema descontínuo” de seleção de ilícitos decorrentes da necessidade de criminalizá-los ante a indispensabilidade da proteção jurídico penal.

Principio da culpabilidade
O Direito Penal primitivo caracterizou-se pela responsabilidade objetiva, isto é, pela simples produção de resultado. Porém esta forma de responsabilidade criminal esta praticamente erradicado do Direito Penal contemporâneo, vigindo o principio do nullum crimen sine culpa.
Como afirma Munõz Conde, “A culpabilidade não é uma qualidade da ação, mas uma características que lhe é atribuída para ser imputada a alguém como seu autor e fazê-la responder por isso”. Dessa forma não há culpabilidade em si individualmente, mas uma culpabilidade em relação aos demais membros da sociedade.
A culpabilidade deve ser vista sobre três aspectos :
1-Culpabilidade como fundamento da pena:
Refere-se a possibilidade de ser aplicado ou não a pena a um autor de fato típico e antijurídico. Sendo necessário a observação de dos seguintes requisitos. a)capacidade de culpabilidade, b)consciência da ilicitude, c)exigibilidade da conduta.
a)Capacidade de culpabilidade :A imputabilidade e a capacidade de culpa, constituindo, a rigor, pressuposto e não elemento da culpabilidade. Sendo a condição pessoal de maturidade e sanidade mental que confere o agente a capacidade de entender o caráter de ilícito do fato ou de determinar segundo esse entendimento. Em suma, é a capacidade genérica de entender e querer, de entendimento da antijuridicidade de seu comportamento e de autogoverno,  que tem o maior de 17 anos, quando esse se apresenta em sua plenitude.
b)Exigibilidade de conduta: Não há reprovabilidade se na situação em que se achava o agente não lhe era exigível comportamento diverso. Subsiste a ilicitude, mas exclui-se a culpabilidade naqueles casos em que o agente cede a presença de circunstâncias ou motivos excepcionais, que tornam inexigível comportamento adverso, como disposto nos artigos 22 e 24 do Código penal.
c)Consciência da ilicitude: a consciência da ilicitude é a consciência que o agente deve ter de que atua contrariamente ao direito.Essa consciência, ao menos potencial, é elementar ao juízo de reprovação, ou seja, a culpabilidade. Não pode agir cupavelmente quem supõe, por erro, que atua conforme ao direito. A consciência da ilicitude e elemento da reprovabilidade. Não é algo que o agente seja reprovado, mas a razão pela qual ao agente se reprova a conduta antijurídica, ou seja, reprova-se ao agente a sua conduta porque podia conhecer a sua ilicitude e porque podia omiti-la (Welzel).
 2 - Culpabilidade como medição da pena
Nesse aspecto a culpabilidade não funciona como fundamento da pena, mas como limite desta, impedindo que a pena seja imposta alem da medida prevista pela própria idéia de culpabilidade, aliada a outros critérios, como importância do bem jurídico, fins preventivos, etc.
3- Culpabilidade como conceito contrario a responsabilidade objetiva
Nessa acepção, o principio da culpabilidade impede a atribuição de responsabilidade objetiva. Ninguém respondera por um resultado absolutamente imprevisível, se não houver obrado com dolo ou culpa.

Principio da ofensividade  ou lesividade
 Para que se tipifique algum crime, em sentido material, e indispensável que haja, pelo menos, um perigo concreto, real e efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido.Ou seja, o legislador deve abster-se de tipificar como crime ações incapazes de lesar ou, no mínimo, colocar em perigo concreto o bem jurídico protegido pela norma penal. Sem afetar o bem jurídico, no mínimo colocando-o em risco efetivo, não há infração legal.
 O principio da ofensividade no Direito penal tem a pretensão de que seus efeitos tenham reflexos em 2 planos, servir de orientação a atividade legiferante ou seja de fazer leis, fornecendo substratos políticos-juridicos para que o legislador adote, na elaboração do tipo pena, a exigência indeclinável de que a conduta proibida represente ou contenha verdadeiro conteúdo ofensivo a bens jurídicos socialmente relevantes; no segundo plano, servir de critério interpretativo, constrangendo o interprete legal a encontrar em cada caso concreto indispensável lesividade ao em jurídico protegido.
Ou seja, o principio da ofensividade ou lesividade, exerce dupla função no Direito Penal em um estado Democrático de Direito :
a)Função política criminal : se manifesta nos momentos que antecedem a elaboração dos diplomas legislativo-criminais;
b)Função interpretativa ou dogmática : se manifesta a posteriore, isto é, quando surge a oportunidade de operacionalizar-se o Direito Penal, no momento em que se deve aplicar, in concreto, a norma penal elaborada.

Princípio da Proporcionalidade
  É a garantia constitucional de todo ordemanento  jurídico, preconizando que deve existir uma proporcionalidade entre a gravidade do crime praticado e a sanção a ser aplicada. 
  O principio da proporcionalidade, como já era consagrado por Beccaria, foi recepcionado na nossa constituição, em vários dispositivos, tais como: exigência da individualização da pena(art 5º, XLVI), proibição de determinadas modalidades de sanções penais (art 5º, XLVII), admissão de maior rigor para infrações mais graves (art 5º, XLII, XLIII E XLIV).
O principio da proporcionalidade e da razoabilidade não devem ser confundidos, embora estejam intimamente ligados e, em determinados aspectos, completamente identificados. Na verdade, há que se admitir que se trata de princípios fungíveis e que, por vezes, utiliza-se o termo “razoabilidade” para identificar o principio da proporcionalidade, a despeito de possuírem origens completamente distintas: o principio da proporcionalidade tem origem germânica, enquanto a razoabilidade resulta da construção jurisprudencial da suprema corte norte-americana. Razoável e aquilo que tem aptidão para garantir objetivos a que se propõe, sem contudo, representar excesso algum.
 A razoabilidade exerce função controladora da aplicação dos princípios da proporcionalidade. Com efeito, é preciso perquirir se, nas circunstâncias, é possível adotar outra medida ou outro meio menos desvantajoso e menos grave para o cidadão.
 Para a aplicação da pena proporcionalmente adequada, a dogmática penal socorre-se também da culpabilidade, aqui não como fundamento da pena, mas como limite desta;nas excludentes de criminalidade ou causas justificadoras igualmente se fazem presentes os princípios não apenas da proporcionalidade, como também da razoabilidade.
 Para concluir, com base no princípio da proporcionalidade é que se pode afirmar que um sistema penal somente estará justificado quando a soma das violências e punições arbitrárias – que ele pode prevenir, for superior à das violências constituidas pelas penas que cominar. Enfim, e indispensável que os direitos fundamentais do cidadão sejam considerados indisponíveis (e intocáveis), afastados da livre disposição do Estado, que alem de respeitá-los, deve garanti-los.



Fontes:
Bitencourt, Cezar Roberto - Parte Geral - 2010
Fragoso, Heleno Cláudio - Lições de Direito Penal - 2006